SARDINHA ABUNDANTE NO ARRANQUE DA ÉPOCA
Frescas, vivazes, de tamanho regular e em número considerável para o mês, é como os pescadores da Afurada falam das sardinhas capturadas no início da época de pesca que arrancou segunda feira. É na Doca de Leixões que as vemos pela primeira vez, acabadas de descarregar dos vários barcos que ali aportam. Alguns deles oriundos da Afurada. É ali que começamos a nossa viagem.
O início da jornada depende sempre dos ‘humores’ da natureza. Quando o vento é agreste, como quarta feira passada, há amarras que só se soltam às 3h da manhã. Noutros dias, podem sair às 21h. Enquanto os homens procuram a rota da sardinha ao largo da costa, com ajuda de alguma tecnologia de bordo, a vila piscatória dorme. Mas quando o dia nasce, já as mulheres aguardam na Doca de Leixões os primeiros barcos que trazem o sustento do dia: logo pela manhã, os mercados da Afurada, da Aguda e as carrinhas que buzinam de porta em porta enchem-se de pescado fresco.
As primeiras são logo ali vendidas na lota, pelas peixeiras de Matosinhos: 3,5 euros/kg, naquele dia. Atravessamos o mercado, entre lavagens de piso e gaivotas preguiçosas (aproveitam as caixas de peixe miúdo), para esperar os barcos que chegarão em breve. Entre eles, o Mestre da Galileia, do Mestre Ramiro.
Observamos os movimentos em redor: os carros transportadores irrequietos e as pessoas apressadas com sacos ou pequenos baldes de peixe na mão contrastam com a quietude de quem aguarda na semiclandestinidade. “Eles [os guardas] estão ali, à paisana...”, alertam-se discreta e mutuamente, esperando os pescadores que lhes possam ‘ceder’ um ‘quinhão’ para o ganha pão do dia.
Os altifalantes anunciam a sardinha de primeira venda na lota. O mestre Ramiro sairá em breve dos armazéns, onde o preço é ‘leiloado’: “Hoje foi bom, para a época: 20 euros por cada um dos “43 cabazes” capturados em Ovar. Voltámos à Afurada, onde chegam outras embarcações, entre elas ‘Arminda Coutinho - Douro’, liderada por Jesus. Não se queixa da quantidade, pois nesta primeira semana conseguiu uma média de 70/80 cabazes por dia, mas queixa-se das políticas de pesca: “Hoje vendemos a 14 euros cada 22,5 Kg. Mas as leis afastaram as pessoas da pesca. Tenho muitos colegas parados (quatro, pelo menos), pois não conseguem companha. Só este ano é que o Governo, por causa da pandemia, deu fundo de desemprego a quem desconta cinco meses”.
O Mestre Marcos também não está contente. Regressou com o ‘Trevo da Felicidade’ vazio: “Maio e junho nunca são muito bons, mas só para nós, porque as traineiras apanharam muito peixe!”. No mercado, a sardinha, de Peniche e Matosinhos, custa cinco euros.
As peixeiras Rosa Alexandre e Maria Necas aguardam pelos dias de maior procura, mas garantem que o sabor já está todo lá: a culpa é da sua gordura saudável, benéfica para o coração.
A faina começou, finalmente!